Paragominas

© René Poccard-Chapuis

Certificação territorial e paisagens eficientes em Paragominas (PA)

A colonização em Paragominas começou com a construção da rodovia Belém-Brasília, inaugurada em 1959. O fundador, Célio Miranda, iniciou a distribuição de glebas com superfície de 4 mil hectares, que até hoje estruturam a malha fundiária regional.

O primeiro ciclo de produção econômica no município se baseou na pecuária de corte, incentivada pela política de “colonização pela pata do boi”. Rapidamente, os migrantes, oriundos do Sudeste do Brasil, perceberam a riqueza das florestas, com alta densidade de espécies de valor comercial (como a madeira de lei).

Paisagem de Paragominas

© René Poccard-Chapuis

Nas décadas seguintes, consolidou-se um modelo de economia extrativista, no qual a renda produzida pela extração madeireira era investida em mais desmatamentos. A rápida degradação das florestas e das pastagens gerou um colapso no final dos anos 1990.

Um novo ciclo produtivo foi então inaugurado com adaptação da agricultura mecanizada de grãos que só foi interrompida em 2008, pela operação Arco de Fogo, conduzida pelo governo federal no quadro do Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento na Amazônia (PPCDAM). Em resposta a essa política de “comando e controle”, as lideranças de Paragominas criaram um novo modelo de governança ambiental, baseado em um pacto entre setores públicos e privados, que ficou conhecido como Município Verde.

Embora a gestão florestal tenha melhorado, esse modelo de governança não conseguiu alavancar pautas essenciais como a restauração de áreas degradadas ou a redução do risco de incêndios. Persistem características dos modelos econômicos anteriores, com paisagens desordenadas, atividades que não levam em conta as aptidões do solo, florestas fragmentadas e agravamento de problemas decorrentes de secas.

A INTELIGÊNCIA TERRITORIAL EM PARAGOMINAS

Em 2012, trabalhando em um diagnóstico agrário em Paragominas, pesquisadores do Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento (Cirad), da Universidade Federal da Amazônia (UFRA), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e da Universidade Federal do Pará (UFPA) concluíram que a redução do desmatamento obtida pelo pacto do Município Verde não propiciou o surgimento de sistemas agrícolas alternativos, com capacidade de promover o desenvolvimento sustentável. Os pequenos agricultores continuavam à margem da economia agrícola e do desenvolvimento territorial, exigindo soluções inovadoras.

© René Poccard-Chapuis

Paragominas havia emergido do período de desmatamento desenfreado com um cenário de florestas fragmentadas e vulneráveis a secas. A localização esparsa e desordenada da cobertura florestal não era propícia à produção de serviços ecossistêmicos, deixando de proteger os solos e a biodiversidade e de regular o clima regional.

As áreas de produção agropecuária nem sempre estavam localizadas nos solos mais adequados à mecanização, à adubação e à irrigação, com prejuízo para o manejo eficiente dos recursos e para a geração de emprego e renda.

AS AÇÕES

O projeto de Acompanhamento Territorial em Paragominas nasceu de interações entre os atores sociais e culminou na elaboração do Plano de Inteligência e Desenvolvimento Territorial, instituído pela prefeitura municipal, principal parceira no processo.

Na metodologia desenvolvida, a noção de sustentabilidade é um valor central, que deve ser definido pelos atores territoriais, e não por atores externos ou definições globais.

Outro componente importante do processo é repensar a organização espacial da matriz de produção agropecuária e da matriz florestal. Buscou-se identificar quais atividades seriam mais eficientes em áreas já desmatadas, para intensificar a produção agropecuária nesses espaços, de forma a promover um desenvolvimento sustentável.

© René Poccard-Chapuis

Observa-se que que quanto mais os produtores rurais passam a investir em práticas mais intensivas e em sistemas manejados, eles concentram o uso da terra nos solos com maior aptidão. Assim, porções da paisagem ficam disponíveis para a regeneração florestal. Essa dinâmica é promovida pelo programa de intensificação e verticalização agropecuária, que é ordenado por dois instrumentos de gestão: o sistema de informação geográfica, que mapeia as aptidões e os usos, e o microzoneamento municipal, que regula a gestão ambiental e produtiva de acordo com essa cartografia. Essa inteligência territorial permite acelerar o processo de reconstrução de paisagens na região.

Além das paisagens, as comunidades rurais também são base da sustentabilidade em Paragominas. No entanto, como é usual na Amazônia, elas ficam de fora da gestão do território, o que acaba reforçando dinâmicas prejudiciais, como êxodo rural, insegurança alimentar e insegurança fundiária. A importância das comunidades precisa ser reconhecida e instituída no território, para que elas possam se tornar um vetor de organização social e produtiva, melhorando a qualidade de vida de todos. Um amplo programa de atividades foi desenvolvido, incluindo treinamento de lideranças, criação do fórum das comunidades, capacitações sobre práticas inovadoras e participação na definição do plano diretor municipal por meio das ações:

    • Realização de um bom diagnóstico inicial, em todo território, incluindo todos os grupos sociais, com atualização permanente. Iniciou-se esse trabalho com 243 questionários em 16 comunidades. Todas as 46 comunidades do município estão sendo monitoradas.
    • Promoção de aprendizagens técnicas e organizacionais, envolvendo agricultores e serviços de apoio. Em Paragominas, trabalha-se a pecuária verde, a agricultura sem fogo e a produção de cacau.
    • Construção e instituição de espaços de discussão coletiva, especialmente entre atores do mundo rural, para combater o isolamento institucional. Foi constituído o Fórum das Comunidades Rurais e, até 2021, já foram realizadas seis jornadas temáticas sobre tópicos como agroecologia, economia solidária e regularização ambiental, além de construção e discussão de cenários territoriais.
    • Produção de cartografias para ordenamento territorial, com o objetivo de auxiliar os gestores públicos e privados a tomar decisões apropriadas e a monitorar os desempenhos do território. O projeto conduziu a um mapeamento das aptidões do solo e do uso dos espaços em todo o município. Foram delimitadas áreas prioritárias para restauração florestal e áreas aptas para intensificação agropecuária. Também ocorreram medições e monitoramento de serviços ecossistêmicos relativos ao ciclo da água, ao ciclo do carbono, à biodiversidade e à proteção de solos.
      A prefeitura traçou o objetivo de utilizar essa cartografia como base para o reordenamento do território. Ou seja, o mapeamento será utilizado pela gestão municipal para validar Programas de Regularização Ambiental, licenças produtivas e outros processos.

© René Poccard-Chapuis

OS RESULTADOS

No que diz respeito aos resultados do projeto, a grande inovação é o estabelecimento de um sistema de certificação do território.

Essa certificação atestará, de acordo com critérios confiáveis e de forma transparente, o desenvolvimento sustentável do território. Ao assegurar que os usos estabelecidos no território são economicamente sustentáveis, o certificado elevará a atratividade de Paragominas para investidores com capacidade de trazer recursos ao processo.

Um dos pilares da certificação é o monitoramento do uso da terra, com a meta de recompor uma matriz florestal (para produção de serviços ecossistêmicos) e uma matriz agropecuária (para produção concentrada em áreas de maior aptidão do solo). Outro pilar é a consolidação das comunidades rurais, nas quais se busca fortalecer as lideranças e estimular o envolvimento dos atores locais na gestão do território.

Outros resultados do projeto são:

    • A elaboração de um plano de desenvolvimento territorial de Paragominas, formalizado por decreto municipal em 2019, o que mostrar que é possível combinar metas econômicas e ambientais para o desenvolvimento sustentável do território.
    • A definição de apoio financeiro, logístico e científico da Agência Francesa de Desenvolvimento para que o município possa conduzir seu plano, no âmbito do projeto TerrAmaz, que apoia a transição de territórios amazônicos para modos de desenvolvimento sustentáveis e livres de desmatamentos ilegais.
    • A elaboração de uma plataforma de cartografia online para divulgação das informações sobre dinâmica de paisagens e serviços ecossistêmicos no município.
    • Planejamento de um conjunto de municípios vizinhos em constituir um consórcio para expandir a mesma metodologia desenvolvida em Paragominas, com o objetivo de estabelecer uma certificação territorial em uma área maior. O consórcio inclui Abel Figueiredo, Rondon do Pará, Dom Eliseu, Ulianópolis, Ipixuna do Pará, Bom Jesus do Tocantins e Paragominas.

PROJETOS REALIZADOS

    • Public and private commitments to zero deforestation (2018-2021), financiado pelo CGIARS
    • TerrAmaz (2020-2024), financiado pela AFD
    • Sustenta&Inova (2022-2025), financiado pela União Europeia
INSTITUIÇÕES PARCEIRAS
FINANCIADORES

PUBLICAÇÕES

Poccard-Chapuis R., Plassin S., Osis R., Pinillos Cifuentes D.A., Martinez Pimentel G., Cordeiro Thalês M., Laurent F., De Oliveira Gomes M.R., Ferreira Darnet L.A., De Carvalho Peçanha J., Piketty M.G.. 2021. Mapping land suitability to guide landscape restoration in the Amazon. Land, 10 (4) : 23 p. DOI: 10.3390/land10040368
Pinillos Cifuentes D.A., Bianchi F.J.J.A., Poccard-Chapuis R., Corbeels M., Tittonell P., Schulte R.. 2020. Understanding landscape multifunctionality in a post-forest frontier: Supply and demand of ecosystem services in Eastern Amazonia. Frontiers in Environmental Science, 7 : 16 p. DOI: 10.3389/fenvs.2019.00206
Brandão F., Piketty M.G., Poccard-Chapuis R., Brito B., Pacheco P., Garcia E., Duchelle A.E., Drigo I., Carvalho Peçanha J.. 2020. Lessons for jurisdictional approaches from municipal-level initiatives to halt deforestation in the Brazilian Amazon. Frontiers in Forests and Global Change, 3 : 14 p. DOI: 10.3389/ffgc.2020.00096
Osis R., Laurent F., Poccard-Chapuis R.. 2019. Spatial determinants and future land use scenarios of Paragominas municipality, an old agricultural frontier in Amazonia. Journal of Land Use Science, 14 (3) : p. 258-279. DOI: 10.1080/1747423X.2019.1643422

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